Ainda faltavam uns quinze minutos para que o trabalho mediúnico, naquele dia, começasse na sala do andar de cima de nossa casa espírita. Os trabalhadores, aos poucos, iam chegando para mais uma reunião fraterna, quando um assunto veio à baila: a corrupção no Brasil e os maus políticos. Não tardou para que todo mundo ali, inadvertidamente, passasse a se queixar do governo brasileiro, em todas as esferas, onde alguns, mais exaltados, proferiam palavras que apenas revelavam a nossa falta de vigilância, sobretudo na antessala de um trabalho mediúnico, onde, supostamente, colaboramos com a nossa vibração mental. A conversa àquela altura tomava dimensões pra lá de desrespeitosas, quando o diretor da casa, vendo a nossa falta de cuidado, convidou-nos para subir:
– Meus amigos, vamos? Já está na hora e precisamos melhorar as nossas vibrações, porque acho que hoje extrapolamos em nossas análises!- disse-nos, sereno.
Tão logo iniciamos a prece e o trabalho foi aberto, tivemos a manifestação, naquela noite, de dezenas de entidades inconformadas, reivindicando supostos direitos, desprezados pelos seus familiares, outros querendo fazer justiça, inconformados e etc. Daí a nossa reflexão em torno daqueles que estamos numa doutrina que nos pede entendimento, evangelização, serenidade, paciência e resignação. Como pedir aos desencarnados aquilo que ainda não temos em nós? Acabáramos de despejar nossa desaprovação lá fora, como, agora, pedir que os nossos irmãos trazidos pelos benfeitores adotassem virtudes que não encontrávamos em nós?
Como se não bastasse a crise consciencial, ao término do trabalho, como de praxe, tivemos a palavra amiga do benfeitor espiritual chamando-nos a atenção para os perigos do pessimismo, numa palestra amiga que nos comoveu a todos:
– Meus filhos, a paz do Senhor permaneça conosco! Nunca será demais refletirmos em torno da vigilância e da oração, que todo cristão sincero necessita exercitar cotidianamente, a fim de se livrar dos malefícios do pessimismo que faculta a investida dos adversários da luz ante o trabalho edificante e mesmo frente ao nosso próprio equilíbrio… Não nos esqueçamos, meus filhos, que o Espiritismo é o Evangelho Redivivo, A Boa Nova que o Cristo nos trouxe para que a esperança nunca morra em nós! Se a luta está difícil é prudente não cairmos nas armadilhas do pessimismo e da execração. Oremos por aqueles que nos governam, para que não percam a lucidez e a serenidade nas difíceis provas que trazem perante as coletividades humanas, porque, invariavelmente, também eles terão que prestar contas de seus atos, independente de nossa reprovação ou não. Mas, é imperioso saber que para que a atmosfera que elegemos para nós não nos traga prejuízos é necessário vontade firme e vigilância permanentes, sem os quais estaremos em consórcio direto com as forças avessas à luz! O silêncio é a oração dos que creem verdadeiramente em Deus! Não apenas na casa espírita, mas onde quer que estejamos, lutemos para não nos juntar à turba desvairada daqueles que apenas querem apedrejar!… Recordemos de Jesus!… Confiemos no trabalho como o mais poderoso exército contra as injustiças humanas! Auxiliemos sem exigir tributos de gratidão!
– Estes são os votos sinceros de vossos irmãos espirituais e deste irmão menor, que tendes a caridade de ouvir. Muita Paz!
Terminado o trabalho escondemo-nos em nossa pequenez, certos de que falar por falar, criticar por criticar, definitivamente, não faz parte do ideário do espírita-cristão verdadeiro. Que o Espiritismo é uma Doutrina Otimista, ensinando-nos que a Terra passa por momentos de grande transição, época da separação do joio e do trigo.
Naquela noite, particularmente para mim, que narro esse acontecimento, tive muita vergonha da minha falta de serenidade e otimismo.
É preciso lutarmos muito, sobretudo nestes dias de imensa convulsão por que passa o nosso país, de não cairmos na gritaria que mais desconstrói do que edifica. E, como todos sabemos, usar mais do silêncio que costuma falar mais alto do que qualquer outra coisa!